Meu bairro... Moro aqui: Nova Descoberta / Parte ll

E-D: Maria Inês, Marluce Rodrigues, Shirley da Silva e Gerailsson Silva

Nova Descoberta / Parte ll

Por Joás Benedito e Raquel Freitas
Fotos Joás Benedito

Nossa guia Marilene Gomes
Se na edição passada da Agenda Cultural do Recife o bairro de Nova Descoberta parecia uma pintura ao ar livre, dessa vez, ele chega aos nossos olhos despido desse conceito. Tudo isso porque deixamos de observá-lo de longe para que pudéssemos reconhecer, em cada face dos seus moradores, o sentido que eles dão à transformação urbana e social na comunidade. Dessa maneira, Nova Descoberta deixa de ser algo distante e passa a atuar dentro de uma realidade comum a qualquer cidadão. Mas se engana quem pensa que a sua turbulência cotidiana (carros, buzinas e motocicletas) e as ameaças de uma possível criminalidade, problema inerente a qualquer bairro ou cidade, venha a inibir o poder incentivador que persiste no dia a dia dos educadores (moradores) sociais.


Não é novidade para ninguém essa “tal” de transformação social. Talvez por ser tão banalizada nos discursos rotineiros, ela se torne tão corriqueira a inúmeras associações relacionadas aos problemas sociais; dessa forma, a vulgarização da palavra restringe o seu espaço de ação. Sendo assim, a transformação social age num campo bem mais extenso do que se imagina. Agora, percorrendo os passos dessa mutação social e urbana no bairro de Nova Descoberta, podemos observar de perto quem são as pessoas e os grupos culturais que mostram que é sim possível ampliar o horizonte de vivência de cada morador e do local onde vivem.

Antigo local de ensaio do Grupo Paranaguases Caboclinhos
A exemplo desse contexto social, podemos citar o atuante Grupo Paranaguases Caboclinhos. Situado na Avenida Vereador Otacílio Azevedo, o espaço, que foi fundado desde 1953, é presidido atualmente por Marilene Gomes, mais conhecida no bairro como Leninha. “Depois que meu avô (José Severino Gomes) – que foi também o fundador – faleceu, decidi dar continuidade ao seu trabalho”, afirma. O grupo atende cerca de 65 pessoas da comunidade, que alternam entre as obrigações pessoais e a paixão pelo grupo. “Além de presidente, sou também técnica em enfermagem. Nos dias em que não estou trabalhando, dou um suporte ao grupo elaborando confecções, dando alguns ajustes nos adereços e também ensaiando”, relata Leninha.

Marilene Gomes mora no bairro de Nova Descoberta desde que nasceu, mas somente há 11 anos ela e a sede do grupo residem no conjunto habitacional, localizado na avenida citada no início do texto. Antes de Marilene ficar à frente do Paranaguases, ou seja, antes do falecimento do seu avô, o grupo de dança popular era muito associado às danças indígenas. “Tudo isso porque meu avô era descendente de índio. E também porque ele usava muitos acessórios que faziam ligação com a cultura, como penas e cocais”, enfatiza. Esse grupo, que ainda vem crescendo e tomando corpo, representa culturalmente o local fora das fronteiras do próprio bairro, apresentando-se em cidades como Bezerros, Paudalho, entre outras. “Ele é importante porque mostra que aqui não há somente criminalidade”, defende a presidente.

Mas todo bairro que se preze, além dos elementos e grupos culturais que contribuem para determinadas formas de educação e cidadania, possui equipamentos comerciais que colaboram para o crescimento financeiro dos moradores. O Mercado Público de Nova Descoberta, inaugurado em 1973, que antigamente era conhecido por Centro Comercial de Nova Descoberta, disponibilizava espaços para encontros culturais. Segundo alguns comerciantes, esses espaços foram extintos devido ao crescimento do fluxo de pessoas e aos novos pontos comerciais, que foram surgindo com o passar do tempo. Hoje, é possível encontrar nele diversos espaços que vendem carnes, cereais, frutas e verduras, além de artigos de armarinho e outros produtos.

Fábio Lima - comerciante do Mercado Público de
Nova Descoberta
Para o comerciante Fábio Lima, os espaços serviam como pontos de encontros culturais por causa do surgimento de novos pontos comerciais. Ele afirma que, mesmo com o crescimento desordenado, atingindo até o trânsito, o espaço tem sim o seu lado positivo, aumentando as vendas e proporcionando uma estabilidade financeira. Porém, ele alega que sente falta dos eventos naquele local. “De uns tempos para cá, Nova Descoberta recebeu muita gente que migrou de outros bairros. Antigamente, havia diversos eventos aqui quando o mercado funcionava apenas de segunda a sexta-feira.”

Dentro de todo esse contexto social que envolve escolas, igrejas, conjuntos habitacionais, campos de futebol, grupos, agremiações culturais e pontos comerciais, estão presentes também os grupos sociais, que atuam diretamente com a comunidade e que, de certa forma, contribuem para o avanço do bairro. Um exemplo bem claro disso é o Clube de Mães dos Moradores do Alto do Refúgio. Fundado em 7 de julho de 1982, ele sedia oficinas de teatro, percussão, leitura, dança e outras modalidades artísticas.

Mercado Público de Nova Descoberta, que está localizado na
Avenida Vereador Otacílio Azevedo 
Gerailsson Silva de Araújo, educador social do Clube de Mães, alega que um dos focos principais do grupo é trabalhar de forma direta com crianças, adolescentes e as famílias da comunidade. Segundo ele, os integrantes atendem diariamente os moradores circunvizinhos, mantendo acompanhamentos pedagógicos e médicos. “O Grupo tem essa missão de saber como andam as crianças nas escolas, sua saúde e como está a renda familiar de cada morador.” O Clube de Mães também se preocupa com o meio ambiente, fazendo conexões com grupos de outros estados como, por exemplo, o Pau e Lata do Rio Grande do Norte. Os trabalhos musicais são resultado das oficinas com tambores artesanais feitos de tonéis e latas, além de materiais recicláveis. Isso possibilita a cada criança interagir com a própria música e colaborar de alguma forma com o ambiente onde vivem, isto é, reciclando o lixo.

Integrantes do Refúgio do Frevo
Segundo Maria Inês da Silva, professora do Clube há mais de 15 anos, o trabalho realizado no projeto proporciona mudanças positivas na personalidade das crianças. “Nas apresentações, conseguimos ver o brilho no olhar de cada um. É uma transformação muito bacana porque no dia a dia muitos andam descalços, sem camisa e quando vão se apresentar é outra coisa, outro semblante”, relata.

É dessa forma que o bairro torna a sua história concreta, através de narrativas e exemplos de vida que fazem com que o bairro de Nova Descoberta seja lembrado por outras gerações. O local deixa para trás a ideia de lugar movido apenas pelo barulho do trânsito e transeuntes estigmatizados pela violência para ser ponto de encontro e refúgio cultural.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

NESTE SÁBADO O GRUPO JOÃO TEIMOSO COMEMORA 23 ANOS COM O SARAU DAS ARTES

Do Choro ao Frevo: Paço do Frevo celebra Dia do Choro neste sábado

Feira que reúne 80 artesãos no RioMar termina na quarta-feira (24)